Ubu Roi
em artes e ideias por Anna Anjos
Prenunciadora do novo teatro do século 20, Ubu Roi ("Rei Ubu") é uma obra escrita por Alfred Jarry, que influenciaria decisivamente movimentos artísticos como o Dadaísmo, o Surrealismo e o Teatro do Absurdo.
1965
Ubu Roi ("Rei Ubu") foi uma peça teatral escrita originalmente por um grupo de estudantes do liceu em Rennes, França, em 1888. Alfred Jarry e seus colegas decidiram parodiar o aspecto grotesco e boçal de seu professor de física, constantemente alvo do ridículo entre os alunos. Jarry (que alguns anos mais tarde decidiu reescrever a peça) valeu-se do personagem Ubu para representar a terrível imagem da natureza animal do homem, expondo sua crueldade e desumanidade.
JarryelaPatafisica139.jpgTrecho da peça "Ubu Roi", de Alfred Jarry, dirigido por Jean-Christophe Averty, 1965
Em 1896, a peça estreou no Teatro do Louvre, em Paris. Com a intenção de confrontar a platéia burguesa com o horror de sua própria maldade, Jarry propôs uma nova forma de representação dos atores: em um cenário de ingenuidade infantil, as vestimentas do elenco altamente estilizado assemelhavam-se a madeira, em uma clara alusão ao universo de marionete. Já surpreso com tamanha ousadia, o público ficou completamente atônito assim que Firmin Gémier (ator que representava Ubu) disse a primeira palavra: Merdre. Foi necessário um bom tempo para que o silêncio do público fosse restabelecido, com manifestações contra e a favor durante toda a noite.
A ação passa-se na Polônia, ou seja, "em lugar nenhum", como o próprio Jarry afirmou na apresentação da peça. Metaforizando o homem moderno, Ubu, personagem monstruoso, corrupto, covarde, estúpido e cruel, assassina o rei Venceslau e usurpa o trono da Polônia. E, ao longo de uma sucessão de episódios absurdos, o rei Ubu exerce seu poder da forma mais brutal e sanguinária, revelando sua política catastrófica. Ao final, Ubu e sua inseparável mãe (Mãe Ubu) fogem de barco para a França. De acordo com a poeta e novelista Jane Taylor, "o personagem central é notório por seu envolvimento infantil com o mundo. Ubu habita um domínio de gananciosos pela auto-satisfação".
O texto non sense de Alfred Jarry em Ubu Roi é recheado de referências à Patafísica (termo que refere-se a "ciência das soluções imaginárias e das leis que regulam as exceções") e, através da exploração do campo das ideias, revela o homem e seu absurdo existencial. Ubu tornou-se o personagem da vida de Jarry, que escreveu outros textos com o anti-herói: Ubu cocu ("Ubu cornudo"), de 1897, inédito até 1944; Ubu enchaîné ("Ubu acorrentado"), publicado em 1900 mas somente encenado em 1937; Ubu sur la butte ("Ubu sobre a colina"), de 1901, e os "Almanaques do Pai Ubu", escritos entre 1899 e 1901.
Para Ana Maria de Bulhões Carvalho, autora de "O Teatro através da História - volume I - As vanguardas teatrais do século XX" (Centro Cultural Banco do Brasil; Entrourage Produções Artísticas, 1994), "Ubu rei é o work in progress que Alfred Jarry jamais abandona em suas inúmeras versões – durante toda a vida é ele mesmo o próprio Ubu, assinando sua correspondência como Pai Ubu!"
Segundo o ator e diretor Ismael Scheffler, "as influências da obra de Alfred Jarry não aparecem de imediato. São artistas das décadas seguintes que encontram, em especial no texto de 'Ubu rei', uma fonte de influências. (...) Caído no esquecimento, Jarry foi 'redescoberto' por Apollinaire, por volta de 1916, e (...) por André Breton, um de seus maiores defensores e divulgadores."
Inicialmente escrita para satirizar o aspecto rude e grosseiro de um professor do universo acadêmico de Jarry, a peça Ubu Roi tornou-se um marco na história do teatro do século 20. Inaugurando uma tradição fundamental na história da encenação moderna, a obra influenciaria decisivamente movimentos artísticos como o Dadaísmo, o Surrealismo e o Teatro do Absurdo, marcando as próximas gerações com sua visão estética vanguardista e sarcástica da nova sociedade burguesa que se iniciava.
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Artigo da autoria de Anna Anjos.
Anna Anjos é ilustradora e artista plástica. Atua para publicidade, editorial, moda e cenografia. É apaixonada por mitologia, antropologia cultural e tem como principal referência a cultura brasileira. | www.annaanjos.com.
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