quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Onirismo

A melhor forma de superar um trauma é sonhar
Fase de sono REM retira peso de memórias difíceis
2011-11-28

Quando sonhamos, química do cérebro que provoca ansiedade é desligada.Sonhar é uma espécie de terapia nocturna porque acontece durante um estágio do sono conhecida como REM – na qual está desligada a química do cérebro que provoca ansiedade – que nos permite processar emoções, retirando o peso das memórias difíceis. Trata-se da conclusão de um estudo realizado na Universidade da Califórnia - Berkeley, nos Estados Unidos.

A investigação, liderada por Matthew Walker, vem explicar porque pessoas que sofrem de stresse pós-traumático recuperam facilmente e não costumam ter pesadelos. O sono ajuda-nos a memorizar e a regular o humor. A equipa norte-americana focou a importância da fase REM, na qual as memórias são reactivadas, colocadas em perspectiva e integradas.

Para o estudo, foram seleccionados 35 adultos, posteriormente divididos em dois grupos. Cada equipa tinha como missão ver 150 imagens de grande carga emocional, duas vezes por dia, durante um intervalo de 12 horas. Enquanto isso, o cérebro dos voluntários era monitorizado por ressonância magnética.

O horário dos grupos variava: uns viam as imagens de manhã e à noite e os outros, de tarde e pela manhã, após uma noite de sono. Os últimos apresentaram uma queda significativa ao nível de reacção emocional, revelando uma diminuição de actividade cerebral, na zona que processa emoções. A actividade cerebral durante o sono foi gravada e revelou a queda de um dos principais químicos associados ao stresse (norepinefrina).

Os resultados, publicados na «Current Biology», indicam que, ao processar emoções sem este químico, acordamos no dia seguinte com a carga emocional aliviada de experiências perturbadoras.



(Ciência Hoje)

Gaza

Falta crônica de medicamentos e suprimentos médicos ameaça vida dos pacientesInstalações médicas da Faixa de Gaza estão sofrendo sem medicamentos e suprimentos médicos essenciais; MSF faz doações periódicas, mas nenhuma organização é capaz de atender a todas as necessidades

Share O embargo israelense à Faixa de Gaza, que teve início em 2007, aliado aos anos de crise financeira da Autoridade Palestina em Ramallah e à falta de cooperação entre as autoridades palestina e de Gaza, está trazendo sérios problemas ao sistema de saúde de Gaza, ameaçando os pacientes que precisam de assistência. Apesar das doações regulares feitas pela organização humanitária internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF), nenhuma organização de ajuda humanitária pode suprir todas as necessidades.

No meio do ano, empresas farmacêuticas interromperam o fornecimento de medicamentos e suprimentos para a Autoridade Palestina. Desse modo, a situação da oferta de assistência médica, que já vinha se deteriorando há muitos anos, ficou ainda pior ao longo do ano, e agora chega a níveis alarmantes.

Com os bombardeios israelenses à Faixa de Gaza em meados de agosto, as autoridades de saúde locais pediram ajuda às organizações humanitárias internacionais presentes na região. Desde então, pedidos regulares tem sido feitos. No entanto, nenhuma organização, incluindo MSF, dispõe dos recursos – financeiros e/ou logísticos – necessários para fornecer os medicamentos e os suprimentos médicos que as instalações médicas dos Territórios Palestinos Ocupados precisam.

36% dos medicamentos essenciais estão em falta

A escassez dos estoques representa uma grande ameaça à saúde dos pacientes. No fim de setembro deste ano, 164 medicamentos essenciais (cerca de 36% dos medicamentos necessários) não estava disponíveis. E apenas 260 itens, de uma lista com um total de 900 suprimentos médicos necessários, estavam sendo fornecidos.

Por enquanto, clínicas da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA, na sigla em inglês) estão garantindo que pacientes que sofrem com doenças crônicas tenham acesso ao tratamento de que precisam. As áreas médicas mais afetadas por essa escassez são cirurgias; cuidados intensivos (uma vez que alguns anestésicos estão em falta); hemodiálise; tratamentos para prevenir a rejeição de órgãos transplantados; oncologia; hematologia (não há coagulantes disponíveis); medicamentos psiquiátricos (dentre os quais apenas 33, de um total de 46, estão disponíveis); oftalmologia (todas as intervenções cirúrgicas foram suspensas); alas de maternidade; atendimentos pediátricos; e procedimentos laboratoriais de colocação de cateteres para diagnóstico e tratamento de doenças cardíacas. Em algumas semanas, os cinco centros médicos que oferecem tratamento para doenças renais também vão experimentar escassez de medicamentos, o que colocará a vida dos pacientes em grande perigo.

Doações periódicas não são suficientes para atender todas as demandas

Ao longo de 2011, MSF fez doações periódicas às autoridades locais na medida em que necessidades mais urgentes e específicas surgiam. Desde 2008, a organização vem criticando regularmente a politização do sistema de saúde palestino e os impactos dos conflitos – tanto internos quanto externos – nos pacientes, que acabam sendo privados de medicamentos e assistência médica essenciais.

MSF, enquanto organização de ajuda médica de emergência, pode estabelecer planos de ações e doações para os centros de saúde da área, mas não é capaz de garantir o fornecimento de todos os medicamentos e suprimentos médicos necessários na região. A organização está seriamente preocupada com o futuro dos pacientes e dos doentes da Faixa de Gaza.

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Gaza: Novas necessidades cirúrgicas
(MSF)

Pensamentando

Imprensa de idéias tem que buscar sua vanguarda entre os trabalhadores, os estudantes, o povo’
Escrito por Valéria Nader e Gabriel Brito, da Redação
Quarta, 23 de Novembro de 2011



Conversar com o jornalista Raimundo Rodrigues Pereira é como reviver os tempos de um outro jornalismo, autêntico e, ao mesmo tempo, efervescente, primordialmente movido pelo espírito investigativo e corajoso, e cujo objetivo essencial era buscar uma informação relevante para o público. Quesitos que estão a cada dia mais distantes das redações, em um mundo em que a função social do jornalismo parece já ocupar um lugar remoto.




Nesta entrevista exclusiva para o Correio da Cidadania, também reproduzida em vídeo em nossa página (em O jornal Movimento e a Mídia Alternativa), Raimundo discorre sobre a experiência do Jornal Movimento, do qual foi editor à época da ditadura (experiência agora retratada em livro organizado pelo jornalista Carlos Azevedo); sobre a mídia alternativa, de ontem e de hoje; a relação dessa mídia com o poder; a regulamentação social da mídia pelo Estado; e as perspectivas que se abrem com a crise do neoliberalismo e com o atual governo.



O jornalista acredita que o governo Lula criou oportunidades ao movimento popular, mas declara que não teve grandes ilusões com este governo, e tampouco as cultiva com relação ao governo Dilma. Neste sentido, para ampliar as possibilidades da mídia alternativa e progressista, Raimundo vê como grandes responsáveis as lideranças do movimento popular, os progressistas, os jornalistas. “Uma imprensa que tem uma circulação um pouco maior terá uma publicidade da parte desse governo, coisa que não existia na época da ditadura (...) Além do mais, formas de transmitir o que se pensa, do ponto de vista jornalístico, se multiplicaram com esses recursos novos, a internet, blogs, redes sociais...”, ressalta.




Veja abaixo entrevista completa.





Correio da Cidadania: Primeiramente, como o senhor situaria historicamente a experiência do Jornal Movimento, agora retratada em livro, na trajetória da imprensa brasileira, especialmente a imprensa conhecida como alternativa?



Raimundo Rodrigues Pereira: O jornal Movimento nasceu no contexto da distensão do regime militar, que acumulava problemas, como mostrou a eleição de 1974, um grande descontentamento, levando o governo Geisel a fazer a chamada distensão lenta, gradual e segura. Isso teve repercussão na oposição, que começou a se dividir. Nesse contexto, surge o Movimento. Éramos a equipe que fazia o Opinião, onde tivemos um desentendimento que culminou na saída de todo mundo. E também havia um grupo no MDB, autêntico, que embarcou de corpo e alma no projeto. Ele foi fundamentalmente de jornalistas e políticos. Dentro do movimento de massa também havia divisão. Tinha gente que achava que a abertura devia ser aproveitada para avançar, enquanto outros entendiam tal atitude como provocação. Nosso grupo entendeu que dava pra avançar um pouco e fizemos um jornal mais ligado às lutas sociais. O Movimento foi isso.



Correio da Cidadania: Que quadro comparativo seria possível estabelecer entre a imprensa alternativa à época do jornal Movimento e a atual? A mídia mais engajada social e politicamente, supostamente mais democrática, progressista e à esquerda do espectro político, caminhou de modo evolutivo ao longo dos anos?



Raimundo Rodrigues Pereira: Ela teve grandes mudanças. Inclusive, no lançamento do livro sobre o jornal Movimento, em uma espécie de apresentação que fazemos do livro - a diretoria do nosso projeto -, salientamos ser necessário reexaminar o quadro hoje para criar uma publicação com mais alcance e que representasse as necessidades do movimento popular.



Ao lado de inúmeras correntes que essa imprensa representa, devia se tentar o esforço de ter uma imprensa profissional do campo popular, com mais recursos, outra tarefa mais específica, resultante da união dos programas desses diversos órgãos.



O Movimento era um semanário que juntava um monte de correntes que ainda existem, como o MR-8, que hoje vai constituindo o Partido Pátria Livre. Vários movimentos e correntes do PT também eram do jornal, como, por exemplo, a Democracia Socialista, que editou o Em Tempo; tinha gente do Partidão, da Polop, democratas, empresários progressistas que apoiaram o jornal etc. Isso nos deu uma força muito grande.



Pra se ter uma idéia, o orçamento da nossa editora (da revista Retrato do Brasil), a Manifesto, é de cerca de 150 mil reais por mês. O Movimento tinha umas três vezes mais recursos, numa época que não havia praticamente nenhuma publicidade. Vivia do movimento de massas, vendas expressivas em bancas, assinaturas e também a venda mão a mão, uma vez que todos que se julgavam representados pelo jornal o vendiam.



Isso, a meu ver, reflete de certa forma o estágio de desenvolvimento do movimento popular. Muita gente, ao olhar o governo Lula e suas realizações sociais, não vê que questões cruciais ao avanço do país não são tocadas. É um governo que tem seus compromissos. Mas um ponto central de uma publicação ampla de tal tipo é a questão nacional. É preciso ver a questão nacional do ponto de vista dos trabalhadores.



Por exemplo: a última capa da Retrato do Brasil é sobre o Pré-Sal e o petróleo. O petróleo é extraído em águas profundas, precisa enfiar uma sonda a seis quilômetros em alto mar pra tirar óleo de lá. Uma sonda dessas é alugada a meio milhão de dólares por dia. Nós temos umas duas ou mais dezenas de sondas. E vamos precisar de outras. Se fizermos aqui só o casco, e toda a tecnologia mais alta vier de fora – de equilibrar a sonda em alto mar, analisar rochas por métodos avançados –, ficaremos com os empregos mais baratos e teremos enormes remessas de lucros por parte das multinacionais que se instalam aqui com tal finalidade. No final, o Brasil exportará petróleo e fabricará bens primários, de baixo valor tecnológico. Um tipo de desenvolvimento que reproduz, em outro nível, a dominação colonial, a dominação imperialista.



Um dado espantoso do governo FHC é que as remessas ao exterior não passaram de 5 bilhões de dólares anuais. A estimativa do BC para este ano é de 38 bilhões de dólares, só de lucros e dividendos. Portanto, a publicação precisaria de recursos para falar disso, não discursivamente, em palanque, mas mostrando os fatos com convencimento de um público amplo de que se trata de uma verdade de grande repercussão. Tal como nós fizemos, investindo três meses na matéria. Mas não temos recursos mais amplos, pra tocar isso e mais uma série de temas da atualidade. Não é como um semanário, muito mais eficiente no sentido de acompanhar conjuntura e movimentos sociais.



Correio da Cidadania: Como enxerga a mídia alternativa no Brasil de hoje, no qual vivemos formalmente uma democracia, pensando nas relações de poder?


Raimundo Rodrigues Pereira: Acho que está desempenhando um papel menor. Claro que tem de se levar em conta que a luta hoje é mais complicada, mais difícil. Não é uma luta por liberdade política, no sentido amplo, que pode juntar um monte de correntes. Como dizíamos, e muita gente não acreditava, o Movimento juntou setores da própria burguesia, do próprio latifúndio, grandes proprietários de terra e empresários que foram contra a ditadura.



Hoje não é assim. Trata-se de juntar as correntes populares para um tipo diferente de desenvolvimento, já com liberdades políticas amplas. E disputando com a imprensa burguesa, forte, que possui recursos muito maiores do que teríamos normalmente. Portanto, seria necessário um esforço intelectual e jornalístico de maior criação para fazer uma publicação que atendesse tal propósito, um semanário que congregasse essas forças todas.



Correio da Cidadania: De acordo com sua fala anterior, pode-se pensar que o governo Lula, com sua magia e simbolismo, acabou por desmobilizar os movimentos sociais e, na mesma medida, acabou por fazer o mesmo com a mídia alternativa, ofuscando um entendimento maior da conjuntura?



Raimundo Rodrigues Pereira: Eu sou de opinião de que o governo Lula criou oportunidades ao movimento popular, e que ele é o menos culpado. Quem tem grandes ilusões com o governo Lula (e Dilma) tem porque quer. Eu não tinha e não tenho. É um governo que desempenha um papel. Defendemos o governo Lula na questão do mensalão, dos aloprados, mostrando que existia um esforço pra desmoralizá-lo com uma história fantasiosa, de que o PT é o partido mais corrupto da história do país, aquela coisa que a revista Veja transformou num bordão e num jornalismo da pior espécie.



Correio da Cidadania: Mas não falta compreensão dos próprios movimentos populares da importância da comunicação na luta de classes, voltada a seus interesses, com esse mencionado poder de disseminação de idéias, pra competir, de fato, com o espaço ocupado por Vejas e afins? Não falta essa preocupação maior na pauta dos movimentos e populares?



Raimundo Rodrigues Pereira: Há questões que são da nossa responsabilidade, da responsabilidade das lideranças do movimento popular, os progressistas, os jornalistas, que devem aproveitar as condições dadas. Uma imprensa que tem uma circulação um pouco maior terá uma publicidade da parte desse governo, coisa que não existia na época da ditadura. Se somar à publicidade uma publicação que desperta um interesse maior, por contemplar de forma mais ampla o interesse do público, pode-se ter mais sucesso.



Assim, a questão é o modelo jornalístico, o que fazer para buscar esse público mais amplo, o que a meu ver subentende uma compreensão política da situação, a necessidade de criar mais massa em torno do movimento popular, o que não exclui a imprensa partidária e seus avanços, a imprensa temática, que tem suas preocupações específicas e também precisa continuar a existir.



Além do mais, formas de transmitir o que se pensa, do ponto de vista jornalístico, se multiplicaram com esses recursos novos, a internet, blogs, redes sociais...



Correio da Cidadania: O polêmico tema sobre a regulamentação da mídia ganhou força nos anos Lula. O que pensa da idéia de regulação social através do Estado, defendida por expressivos segmentos sociais, e as reações de repúdio da mídia tradicional?


Raimundo Rodrigues Pereira: Bom, existem questões que precisam ser tratadas pelo ponto de vista da lei. Com a revogação da antiga lei de imprensa, não existe mais regulamentação para uma série de questões. O direito de resposta: ele está assegurado a todos na Constituição. Não é brincadeira, mas acho que deveria existir uma lei como aquela que te permite reclamar da qualidade dos produtos. Te vendem um jornal mal acabado, mal revisado, com informações erradas... A qualidade de nossa imprensa também piorou neste aspecto, pois várias coisas foram feitas no sentido de reduzir o tempo de preparação da notícia, incentivar a busca pela última novidade etc. Esse é um aspecto.



O outro aspecto implica em tentar combater o controle claríssimo do grande capital sobre a grande mídia, regulando como eles vão usar o direito deles de se expressar livremente. Querer regular o que a Folha e o Estadão devem dizer é um esforço a meu ver inútil.



Se o governo quer se contrapor a isso, porque tem legitimidade política para tal, faça como o Getúlio Vargas. Getúlio fez o Última Hora, um dos melhores jornais que se inventou no Brasil. O Getúlio pegou um empresário de talento, Samuel Wainer, financiou, os bancos abriram crédito, e se fez um grande jornal. O Última Hora era um excelente veículo, em todas as áreas, política, cultural, um jornal animado, com colunistas brilhantes. Foi um enorme sucesso, com o surgimento de vários similares. E foi destruído pela ditadura. Por quê?



Porque tinha uma bandeira diferente. Não eram as elites tradicionais tentando jogar Vargas para trás do ponto para onde já tinha avançado. Em seu segundo mandato, era uma pessoa progressista, que estava vendo o problema da espoliação do país e seu desenvolvimento, com vínculos com a independência nacional.



Portanto, creio que regular essa mídia é malhar ferro frio. Não se vai conseguir fazer esses grandes jornais se comportarem de acordo com uma cartilha, com uma regulamentação pra eles. Nunca me sensibilizou muito essa idéia. Claro que deve existir lei pra concessão de rádios, TVs etc. Mas veja que os principais órgãos da imprensa, de modo geral, são os jornais escritos, porque é onde se reúne o maior aparato de intelectuais. Um jornal escrito, além de dezenas e dezenas de jornalistas, tem dezenas e dezenas de intelectuais, colaboradores, recursos. Tudo a serviço da investigação dos assuntos, apontando novidades, que viram assuntos do rádio, da televisão, que não possuem tal aparato.



Assim, é preciso ver a imprensa como um núcleo de intelectuais. Porque o jornalista é um tipo de intelectual também, de um certo nível, agregado a intelectuais que pensam as questões mais profundamente, menos ligados ao dia a dia, que vêm de uma visão da realidade. Não é uma coisa simples, mas é esse conjunto que deve ser criado, um conjunto amplo, principalmente quando nos vemos em época que não configura situação de isolamento do campo progressista, em nível global.



Vejamos que a União Soviética surgiu e se desenvolveu sob um cerco enorme, não tinha o acesso ao mercado que tem a China atualmente. Hoje, leio o Economist apostando no Yuan como moeda internacional dentro de dez anos. O Yuan no lugar do dólar em 10 anos! E eles entraram mundo afora com um regime que se diz “ditadura do proletariado”. Claro que se diz isso em relação a Cuba e, sempre que podem, em relação à China, mas não é por aí que se determina nada, a China está aí... Podemos comprar um carro de uma montadora chinesa estatal, para a qual o Faustão faz propaganda. A Jac Motors é estatal. E aqui no Brasil, quando se fala de criar uma estatal, dizem “que absurdo!”. O mundo está muito mudado e é preciso pensar nessa etapa que ainda enxergo como uma tentativa de construção do socialismo, que no Brasil possui inúmeras tarefas no sentido de mostrar o mundo tal como ele é hoje.



Correio da Cidadania: A atual crise do capitalismo, com o escancaramento dos desastres sociais e ambientais a partir do acirramento do neoliberalismo, poderá trazer parte do público cativo dos veículos mais tradicionais para novas fontes de informação, ainda mais com a internet cada vez mais ao alcance de todos?



Raimundo Rodrigues Pereira: Eu talvez seja excessivamente otimista, porque, em 1986, quando estes meios estavam mais ou menos delineados – o uso da computação para aprimorar o processamento da informação –, fizemos um jornal diário, que durou dois meses e nos deixou uma dívida monumental, porque achávamos que tinha chegado a hora de avançar, do ponto de vista da técnica. A world wide web ainda não existia, mas fizemos um projeto no FINEP, começando até a transmitir por rádios nossas comunicações...



Sempre torcemos pra realidade correr de acordo com nossos desejos. Fizemos esse jornal diário achando ser um momento de avanço com o fim da ditadura, com a idéia de usar tais recursos. No lançamento do projeto estavam Helio Bicudo, Ulysses Guimarães, num prédio do centro de São Paulo



Depois, mais recentemente, em 2000, achamos que a conjuntura tinha virado amplamente, quando da crise da Enron, a quebra das Pontocom, e fizemos uma edição da revista que tínhamos à época – Reportagem – intitulada “O vento virou”.



Mas a luta é difícil. Os americanos deram a volta por cima com o Bush, que fez aquela coisa escabrosa de aproveitar atentados da extrema-direita muçulmana contra as Torres Gêmeas pra promover duas guerras e ganhar a segunda eleição muito mais facilmente que a primeira. Depois, a crise veio em 2008, o Obama deixou a turma toda lá, pôs dinheiro em todos os bancos e a mesma crise voltou.



Já dizíamos em 1997, quando lançamos o projeto da revista Reportagem, que nesses termos o capitalismo não tem vida longa. Mas, às vezes, pensa-se que se trata de três, quatro anos, quando podem ser 15, 20. Os sinais hoje são de que realmente a crise tem esse desdobramento, de que foi se agravando a despeito das tentativas audaciosas de se manter o controle, a hegemonia. Acredito que o quadro futuro continuará se agravando no sentido de criar problemas a esse tipo de hegemonia política existente. Mas, para as idéias novas surgirem e frutificarem, demora tempo. O Iluminismo é anterior à Revolução Francesa, que veio bem depois.



Portanto, talvez não tenhamos achado as idéias novas. As pessoas acham que a novidade é o facebook! Nós temos de achar as nossas novidades, que entusiasmem o povo, que correspondam à solução dos problemas que temos pela frente.



Correio da Cidadania: Finalmente, mediante esta exposição de idéias, que tipo de postura política poderia, ou deveria, ter o poder público em prol de uma mídia com as características salientadas pelo senhor? Como enxerga as perspectivas do governo Dilma nessa trilha?



Raimundo Rodrigues Pereira: Deixa eu responder com um exemplo concreto. Nós, como estamos nessa estrada há muito tempo, ficamos pensando maneiras de obter apoio etc. Fizemos o projeto Retrato do Brasil, em 1984, para viabilizar esse jornal diário, de mesmo nome. Bolamos algo interessante, uma espécie de enciclopédia dos problemas brasileiros. Perguntávamos: “O que a ditadura militar resolveu dos problemas do país? E quais problemas criou?”. Fizemos verbetes, juntamos uma equipe grande. Para se ter idéia, o cartaz de propaganda tinha Lula, FHC, Maria Vitoria Benevides e Raimundo Faoro.



O que imaginamos recentemente? “Vamos reeditar o trabalho e vender para o governo”, porque existem mais de 30 mil exemplares nas escolas públicas e já houve Secretaria da Educação que pediu pra reeditarmos o trabalho antigo. Mas até agora não conseguimos vender para o governo. Bati portas, obtive pareceres ultra-favoráveis, porque a obra é realmente muito boa, e não conseguimos.



Eu estaria puxando os cabelos aqui se tivesse muita ilusão. Não tenho. Não é que não tentamos. Tentamos. Mas o governo não tem essa visão. Há amigos nossos que estão no poder que costumam dizer “essa mídia não desempenha um papel”, como se você fosse classificar as mídias pela quantidade de público que atinge. Teria que, obviamente, haver esse lado: se quer vender idéias e transformação, o governo deveria ajudar esse tipo de imprensa; se quer vender sabão OMO, vai ter que contratar o Faustão mesmo, porque nós não vamos ajudar nessa. Mas, como disse, esta não é a ótica que prevalece.



Continuamos buscando, mas o principal é buscar a unidade das correntes populares, dos jornalistas que trabalham nesses meios, pra ter mais recursos para a prática do jornalismo. Não se consegue, por outro lado, fazer uma publicação de amplo alcance se ela for muito ideológica, reduzida ao campo das idéias, pois os fatos ajudam a educar. A educação política do povo é freqüentemente baseada nos conhecimentos do dia a dia. Por isso a imprensa popular, no sentido burguês, digamos, está sempre em busca do crime mais espantoso, inédito, do herói, do grande atleta. A imprensa de idéias tem que buscar uma vanguarda entre os trabalhadores, os estudantes, o povo.



Valéria Nader, economista, é editora do Correio da Cidadania; Gabriel Brito é jornalista.

Última atualização em Sexta, 25 de Novembro de 2011

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(Correio da Cidadania)

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Linguagem

Publicado em 29/11/2011
Será que entendi?
Neste mês e meio de São Paulo e interior paulista, uma coisa percebi: praticamente todas as pessoas com as quais falei mostraram-se bem informadas, inteligentes ou de rápida compreensão.
Nos primeiros dias, achei um tanto estranho mas logo me habituei. Fosse pessoalmente ou pelo telefone, as pessoas em lugar de dizerem « sim, sim » em sinal de assentimento, ou aquele maçante « hamham » no telefone, diziam sempre « entendi ».
Como se tivessem todas combinado, na casa de familiares, na rua, no taxi, na livraria, na padaria, era só eu fazer uma afirmação ou contar qualquer bobagem, nessas conversas sem compromisso que se trava num ônibus ou no metrô, e vinha sempre « entendi! ».
Mas entendeu o quê ?, dava vontade de dizer, pois não tinha feito nenhuma pergunta. Quando constatei ser uma reação geral, me veio a idéia de terem sido acometidos meus concidadãos da metrópole de uma epidemia oral, incontrolável, passageira (como todo modismo linguístico) mas inquietante.
Pior que o pensamento único, é ouvir-se todo mundo, como numa orquestra bem regida, dizer e repetir a mesma coisa. E, na tentativa de localizar a procedência e o mecanismo provocador desse comportamento oral coletivo, imaginei que poderia ser alguma telenovela, mas não parece haver nenhum personagem com o cacoete de dizer « entendi, entendi » a todo momento.
De onde saiu essa identificação geral com a primeira pessoa do particípio perfeito do verbo entender ? Quem começou a dizer « entendi » e por que acabou sendo imitado por todos? Não pude localizar o agente desencadeador e nem poderia, numa cidade de doze milhões de pessoas que, maquinalmente, dizem « entendi », quando ninguém lhes pergunta se entenderam.
Encontrei um amigo, versado em semântica e vícios de linguaguem, e lhe perguntei que seria um modismo. E, para meu desespero, ele que é universitário, dono de um grande vocabulário, me respondeu com uma afirmação redundante :
Com certeza!
Desespero, porque, antes do « entendi », na minha viagem precedente, todo mundo falava « com certeza! ».
De onde surgem essas expressões, que logo envelhecem como o « falou! », « beleza! » ? Se você sabe ou tem uma idéia, conte, porque acho uma « beleza », uma língua tão viva como a nossa, mas não « entendi » ainda o mecanismo de reprodução dessas expressões a ponto de afetarem quase a totalidade da população.
(Direto da Redação)

Itália

Umberto Eco se diz ansioso pela queda de Berlusconi na Itália


O filósofo e romancista italiano Umberto Eco espera que o primeiro-ministro do seu país, Silvio Berlusconi, deixe o cargo dentro de uma semana, no que seria para ele o fim de um longo pesadelo.

Por Edward McAllister*

"Em uma semana, Berlusconi será provavelmente obrigado a renunciar. É o fim de um pesadelo", disse Eco, de 79 anos, numa entrevista destinada a promover seu novo romance, O Cemitério de Praga, a ser lançado terça-feira nos Estados Unidos.

Berlusconi, um magnata conservador de 75 anos, perdeu o apoio de parte da bancada governista em meio a uma crescente crise política e econômica que ameaça desestabilizar ainda mais a economia europeia.

"Teríamos tido esta crise econômica sem Berlusconi, mas o problema teria sido mais leve. Ele não é respeitado no exterior, então não pode representar o país", disse o inflamado Eco, agitando um charuto fino e apagado entre os dedos.

Berlusconi, que já foi premiê da Itália em três ocasiões desde 1994, enfrentou nos últimos meses uma onda de escândalos sexuais e acusações de corrupção, mas é a situação financeira da Itália que ameaça derrubá-lo.

"Se Berlusconi desaparecer amanhã, os problemas não terão acabado, mas pelo menos no fórum internacional a Itália será tratada com respeito", disse Eco, cujo romance O Nome da Rosa, de 1980, vendeu milhões de exemplares no mundo todo.

O escritor não acha, no entanto, que as alternativas políticas disponíveis sejam muito melhores. "A oposição é tão doente quanto Berlusconi. Eles estão brigando entre si, então não serão capazes de oferecer uma alternativa sedutora. Esta é a segunda tragédia da história."

Novo livro

O Cemitério de Praga, uma aventura histórica que já se tornou best-seller em diversos países, é o sexto romance de Eco.

O livro conta a história de um falsificador responsável por um famoso documento que se torna uma das bases para o antissemitismo na Europa: os Protocolos dos Sábios do Sião.
Eco já tinha quase 50 anos quando começou a escrever romances, após uma bem-sucedida carreira acadêmica. Já era autor de vários livros de não ficção e de ensaios quando decidiu buscar novos desafios.

"Num certo momento, decidi escrever uma história. Eu não tinha mais filhos pequenos para os quais contar histórias", afirmou o autor, sentado na beirada de uma poltrona, vestido de forma casual com jaqueta de "tweed", camisa de brim e gravata de tricô.

E o sucesso como ficcionista o surpreendeu?

"Quando a gente começa a escrever um livro, especialmente um romance, até a pessoa mais humilde do mundo espera virar um Homero", disse Eco em tom brincalhão.

*repórter da Reuters

Fonte: Terra


(vermelho.org)

Petróleo

Publicado em 27/11/2011
Malfeitos do capitalismo

O vazamento de óleo na plataforma fluminense permite algumas observações que merecem atenção. A Chevron é, na sua especialidade, no mundo do petróleo, uma empresa grande, segundo dizem maior que a nossa grande Petrobras. Mas essa gigante petrolífera americana (será ela um dos orgulhos da iniciativa particular?), deu um show de incompetência no episódio do vazamento. Mobilizando-se apenas depois de ter sido alertada pela Petrobras, mostrou-se incapaz de identificar com precisão o local do desastre, por falta de equipamento adequado. E foi a nossa estatal que emprestou à empresa americana equipamentos mais modernos, capazes de possibilitar essa identificação e de ensejar um atrasado plano de contenção. Retardando procedimentos, a Chevron revelou-se pouco ágil diante do acidente e, com informações incorretas e desencontradas, permitiu que se pusesse em dúvida outros aspectos de sua gestão no campo administrativo e mesmo ético.
O artigo do Mair Pena Neto aqui no DR (“Fora Chevron!”) é, a esse respeito, bem esclarecedor. E aqui vou além. Que me desculpe o pessoal do neoliberalismo, mas o desastre põe a nu, uma vez mais, a realidade que um pensamento falacioso teima em escamotear: não é verdadeira a afirmação de que o empreendimento particular é, por definição, mais eficiente que o estatal.
E é bom, mais uma vez, tomarmos cuidado para não engolirmos gato por lebre. Ouvi na CBN uma incensada comentarista política declarar que “salta aos olhos”, na ocorrência, a incompetência dos órgãos reguladores (ou seja, vinculados ao Estado), aos quais faltaria uma ação fiscalizadora mais eficaz. Claro que ela não deixou de criticar a petrolífera americana, mas imediatamente me lembrei do caso da TAM, em que certa mídia fez o possível para transferir para o âmbito do Estado brasileiro a responsabilidade pela tragédia de então. Se você prestar atenção, verá que todas as vezes que o empreendimento particular dá com os burros n’água, surge uma acusação ao poder público. Cômodo, não? Os desavisados que ouvem esses acusadores podem imaginar que eles defendem uma forte ação controladora do Estado, mas as pessoas atentas percebem que esse controle só é lembrado nas catástrofes...
Para o neoliberalismo – uma das piores versões assumidas pelo capitalismo -, parece que o bom é a existência de um Estado fraco (chamado Estado mínimo), subserviente, que lhe facilite a vida; um Estado que abdique da instauração do bem-estar social; que privatize, que subsidie, que financie, que privilegie, sem levar em conta os interesses do povo; um Estado, enfim, que dê facilidades, sejam elas morais ou imorais. Um exemplo? O poder público vai gastar quase 1 bilhão de reais para a “reconstrução” do Maracanã nos moldes FIFA, um crime contra um dos ícones da minha cidade. Afirma-se, porém, com a maior tranquilidade, que, depois da Copa, o estádio será entregue à administração particular. Coitado do povão! Já dá para pressentir o “legado” que lhe será reservado: um Maracanã elitizado, construído com dinheiro do povo para o lucro de poucos. Essa é a lógica neoliberal. É para isso que o Estado serve...
Não estou aqui defendendo a excelência do Estado e seus prepostos, que também cometem, e muitas vezes, sérios deslizes. Questiono, sim, essa visão maniqueísta e comprometida que confere um ar vestal ao particular e transforma em pérfido vilão o serviço público. Seja ente público ou privado, ninguém desfruta dos privilégios da excelência. Exemplifico com a recente onda de denúncias de corrupção. É óbvio que devem ser fortemente coibidas e punidas as ações de quem usa o dinheiro do povo em proveito de seus interesses escusos. Mas é bom não esquecer – e esse “esquecimento” é nítido na mídia - que, em inúmeros episódios de corrupção, os corruptores, sedentos de lucro fácil, vêm da iniciativa particular que é, no caso, cúmplice na fraude ao interesse público. Penso que todas as empreiteiras ou congêneres que oferecem propina a funcionários públicos para ganhar concorrências deveriam também submeter-se às penas da lei e, no mínimo, ser definitivamente impedidas de transacionar com o Estado. Uma “ficha-limpa” empresarial... O problema é saber se sobraria alguma...
Como os indignados que vão tomando conta das ruas do mundo, julgo que os atos e fatos aqui expostos se interligam, direta ou indiretamente, em maior ou menor intensidade. Eles deixam à mostra algumas das incontáveis feridas de um perverso sistema econômico fundado no lucro a qualquer título, a qualquer preço, que beneficia uns poucos, penaliza as grandes massas e abomina políticas públicas de um Estado forte que lhe ameace o poder. Também penso que esse sistema – na atual versão - tenderá à agonia, se insistir nas reverências cegas a um deus Mercado com seus apóstolos tecnocratas e suas palavras de ordem contrárias às históricas conquistas sociais dos trabalhadores.
Em recente editorial, o jornal “O Globo” deitou falação sobre o pessoal do “Ocupe Wall Street”, culminando com a apoteótica afirmação de que tentar apressar a “crise final do capitalismo” seria “algo tão ilusório quanto apostar no fim da história”. Sem ousar definir prazos ou mesmo apontar o que virá depois, acho que o bom senso torna possível imaginarmos que o fim do capitalismo, quando vier, estará na essência da dinâmica da própria história...
(Direto da Redação)

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Itália

Umberto Eco se diz ansioso pela queda de Berlusconi na Itália


O filósofo e romancista italiano Umberto Eco espera que o primeiro-ministro do seu país, Silvio Berlusconi, deixe o cargo dentro de uma semana, no que seria para ele o fim de um longo pesadelo.

Por Edward McAllister*

"Em uma semana, Berlusconi será provavelmente obrigado a renunciar. É o fim de um pesadelo", disse Eco, de 79 anos, numa entrevista destinada a promover seu novo romance, O Cemitério de Praga, a ser lançado terça-feira nos Estados Unidos.

Berlusconi, um magnata conservador de 75 anos, perdeu o apoio de parte da bancada governista em meio a uma crescente crise política e econômica que ameaça desestabilizar ainda mais a economia europeia.

"Teríamos tido esta crise econômica sem Berlusconi, mas o problema teria sido mais leve. Ele não é respeitado no exterior, então não pode representar o país", disse o inflamado Eco, agitando um charuto fino e apagado entre os dedos.

Berlusconi, que já foi premiê da Itália em três ocasiões desde 1994, enfrentou nos últimos meses uma onda de escândalos sexuais e acusações de corrupção, mas é a situação financeira da Itália que ameaça derrubá-lo.

"Se Berlusconi desaparecer amanhã, os problemas não terão acabado, mas pelo menos no fórum internacional a Itália será tratada com respeito", disse Eco, cujo romance O Nome da Rosa, de 1980, vendeu milhões de exemplares no mundo todo.

O escritor não acha, no entanto, que as alternativas políticas disponíveis sejam muito melhores. "A oposição é tão doente quanto Berlusconi. Eles estão brigando entre si, então não serão capazes de oferecer uma alternativa sedutora. Esta é a segunda tragédia da história."

Novo livro

O Cemitério de Praga, uma aventura histórica que já se tornou best-seller em diversos países, é o sexto romance de Eco.

O livro conta a história de um falsificador responsável por um famoso documento que se torna uma das bases para o antissemitismo na Europa: os Protocolos dos Sábios do Sião.
Eco já tinha quase 50 anos quando começou a escrever romances, após uma bem-sucedida carreira acadêmica. Já era autor de vários livros de não ficção e de ensaios quando decidiu buscar novos desafios.

"Num certo momento, decidi escrever uma história. Eu não tinha mais filhos pequenos para os quais contar histórias", afirmou o autor, sentado na beirada de uma poltrona, vestido de forma casual com jaqueta de "tweed", camisa de brim e gravata de tricô.

E o sucesso como ficcionista o surpreendeu?

"Quando a gente começa a escrever um livro, especialmente um romance, até a pessoa mais humilde do mundo espera virar um Homero", disse Eco em tom brincalhão.

*repórter da Reuters

Fonte: Terra


(vermelho.org)

Pensamentando

Abstinência de Chumbo
“A esperança de que em algumas décadas se consiga a destruição dos exércitos de países com tradição pacifista pode influir posteriormente em ações maiores… Isso, é claro, se o mundo ainda existir”

28/11/2011 07:00
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Carlos Lungarzo
Em tempos de paz, os filhos enterram seus pais. Em tempos de guerra, são os pais os que enterram seus filhos
Herodotus, escritor grego, dito o pai da historiografia


Uma paz injusta é melhor que uma guerra justa
Marcus Tullius Cicero, o mais célebre dos tribunos romanos

Em minha última coluna (Se uis pacem…) ofereci, como exemplos de países que tinham conseguido acabar com o militarismo, alguns pequenos estados que mantêm a democracia mais estável e a melhor qualidade de vida na América Latina. Em outros estados de nosso continente, riquezas naturais e financeiras convivem com índices de miséria que oscilam entre 40 e 70%.

O caso do Haiti, que há pouco aboliu o exército, não é uma refutação a meu argumento, pois o país sempre esteve dominado pelo caos, e a dissolução das Forças Armadas não foi completa. Aliás, os brutais exércitos nacionais foram substituídos por uma força ainda mais poderosa, a Minustah, invasores fantasiados de “pacificadores”.

Isso não significa que todas as missões de paz tenham o mesmo intuito de esmagar os povos “pacificados”. Porém, quando o objetivo é nobre, é aí que as autoridades militares boicotam sua ação. Durante o hipergenocídio de Ruanda de 1994, verdadeiras forças de paz poderiam ter salvado 900 mil vidas, mas foi exatamente então que os países militaristas recusaram apoio. O chefe da missão e defensor dos direitos humanos, Roméo Dallaire, em seu livro Shake Hands with the Devil, mostra a angústia de não ter podido parar o massacre, o que o levou a várias tentativas de suicídio. Então, embora existam militares bem intencionados, seu número é ínfimo e não conseguem apoio quando se colocam algum objetivo humanitário.
Argumentos Velhos

As premissas de meu artigo anterior não têm nada de novo. Mentes lúcidas e personalidades civilizadas de todos os tempos se manifestaram contra a barbárie militarista, inclusive na Roma antiga, onde era perigoso desafiar o poder castrense.

Entretanto, é imprescindível desenterrar o tema, porque décadas de fascismo ofuscaram essas razões de senso comum, e porque a crise da esquerda “oficial” induziu uma parte da militância a incorporar as doutrinas da direita, para sentir-se representados mesmo por seus antigos inimigos, aos que idealizam como um imaginário “exército democrático”.

As duas epígrafes deste artigo, escritas há mais de 2000 anos, permitem entender que as mentalidades lúcidas e as pessoas sensíveis de épocas diversas já sentiam à flor de pele os estragos do militarismo, mesmo que eles não estivessem entre as vítimas. Embora devessem passar mais de 18 séculos para que se consolidassem as percepções sobre os direitos humanos, o militarismo, como a síntese suprema de sua violação (invasão, genocídio, morte, tortura, estupro, devastação, tudo junto numa mesma ação) já era percebido como inimigo da felicidade humana desde tempos remotos.

Tamanho e Relevância

Eu enfatizei que os países que aboliram o exército são pequenos, como Groelândia e Lichtenstein, e isto pode-se entender por causa das complicadas relações militares num país maior. Entretanto, países sem passado imperialista e com baixa tradição de conflito poderiam desmilitarizar-se lentamente. É ridículo pensar que a relevância de um país depende de sua capacidade de destruição e ameaça. Se assim fosse, o Afeganistão seria um país muito mais importante do que a Suécia.

O desarme poderia ser tentado também em países que passaram sérios conflitos, de que as Forças Armadas foram responsáveis. Este poderia ter sido (mas não foi) o caso da Argentina em 1984, quando um de cada dez habitantes tinha um amigo ou parente desaparecido e, além disso, os militares estavam desmoralizados por ter perdido uma guerra que todos acreditavam ganhar. Mas a cumplicidade ou o medo (ou ambos) dos políticos foram tão paralisantes, que jamais pessoa alguma levantou a possibilidade de uma dissolução das Forças Armadas. Como consequência disso, ainda hoje, militares e policiais sequestram ex-ativistas que poderiam servir de testemunhas em ações contra os carrascos dos anos 70.

O Caso da Suíça

Houve, porém, propostas de dissolução das Forças Armadas que estiveram próximas ao sucesso em países de meio porte, como a Suíça. (Vide)

Em 1986, a iniciativa Por uma Suíça sem Exércitos conseguiu 111.300 assinaturas, sendo 100 mil as necessárias para propor uma votação.

Em 26/11/1989, a primeira votação deu 35,6% em favor da iniciativa. A proporção é grande se pensamos na pressão da Otan e dos mercadores de armas, e da propaganda dos Estados Unidos e seus principais aliados. Ainda que a iniciativa fosse vencida, o surpreendente resultado aumentou a influência do setor civilizado da sociedade e reduziu poderes militares.

Em abril de 1992, o grupo pacifista juntou 503.719 assinaturas, num período de tempo de organização que não passava, no total, de 32 dias. O fato é absolutamente original na história planetária. Mas, a iniciativa foi derrotada por 57 a 43%, um resultado muito melhor que o anterior.

Em 10/06/2001, numa nova votação, a dissolução das Forças Armadas não foi colocada, mas sim se revisou a legislação para impedir, entre outros excessos, o uso das Forças Armadas suíças em ações fora do país. Essa posição ganhou por 51% e estimulou os suíços a pensar que, na próxima votação, a dissolução do exército seria aprovada.

Os ataques de 11 de setembro em Nova York, carente de qualquer nexo com a Suíça (que, aliás, é um país neutro), serviram de pretexto à propaganda da Otan para reviver a suposta necessidade de militares. O pânico da população e o brain-polluting (quem disse “washing”?) fez fracassar esta iniciativa.

Entretanto, o avanço foi importante, já que nunca um país central com enorme influência europeia tinha estado tão perto de dissolver as Forças Armadas. A esperança de que em algumas décadas se consiga a destruição dos exércitos de países com tradição pacifista (Suécia, Noruega, Dinamarca), pode influir posteriormente em ações maiores… Isso, é claro, se o mundo ainda existir.

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Sobre o autor

Carlos Lungarzo

* Doutor em Ciências Exatas e em Ciências Humanas. Publicou 11 livros sobre lógica, estatística e informática, e 82 artigos. Foi professor da UNICAMP (1976-1997) e UERJ (2000-2004). É ativista de Anistia Internacional desde 1982. Acaba de escrever um livro sobre o caso Battisti.

Outros textos do colunista Carlos Lungarzo.
.(Congresso em Foco)

Bolsonaro

Bolsonaro e o decoro parlamentar
Não se iluda o deputado pelo Rio de Janeiro. Se houver uma vontade política da maioria da Câmara dos Deputados, o seu mandato poderá vir a ser cassado por falta de decoro parlamentar. O conceito de decoro é político. O julgamento político não se submete aos ritos jurídicos comuns.
Mauro Santayana

Os debates parlamentares são, normalmente, incontroláveis. Desde que há parlamentos, as discussões conduzem a insultos e impropérios. Mas nem sempre os mais audaciosos na virulência, ou no mau gosto de seus argumentos, conseguem ser bem sucedidos na política. A ironia inteligente, a lógica no argumento e a paciência didática na defesa de uma idéia, ou de uma posição em assuntos pontuais, são sempre mais eficientes no confronto parlamentar.

O deputado Jair Bolsonaro, quer isso nos agrade ou não, representa uma parcela ponderável do eleitorado do Rio de Janeiro, constituída de militares saudosistas do regime ditatorial, de obstinados lacerdistas, de neoconservadores. Sua presença no Parlamento é assim legítima, de acordo com os ritos da democracia representativa. Ele é protegido, pelo que disser na tribuna, pela imunidade parlamentar. Sendo assim, nada pode impedir seus excessos verbais – a não ser uma ação política. O julgamento político, pelo parlamento, não está sujeito a regras jurídicas. Ele depende da vontade da maioria dos representantes do povo, sobretudo quando se trata de verificar se o acusado ofendeu ou não o decoro parlamentar.

Na defesa de suas idéias, mais do que conservadoras, o deputado Bolsonaro não se impõe limites. Ninguém pode impedir que ele defenda um governo de extrema direita, da mesma forma que seria estúpido impedir que alguém defendesse o contrário, ou seja, uma política de extrema-esquerda, conforme garante a Constituição. Mas aos debates parlamentares convém um mínimo de cortesia e de respeito aos outros. Bolsonaro é costumeiro em se dirigir, sobretudo às mulheres, com palavras pesadíssimas, que não são próprias de um cavalheiro, senhor de sua hombridade - em todos os significados do último vocábulo.

Quase sempre depois de um escorregão mental, ele se desculpa, e procura muletas semânticas, a fim de amenizar o que dissera antes. Essa é uma tática comum, não só no parlamento como na vida de todos os dias, a de desmentir intenções. Na realidade, os doestos, uma vez disparados, permanecem com seus efeitos perversos.

É natural que a muitas pessoas pareça incômoda a postura da sociedade moderna diante de certos comportamentos humanos, que lhes pareçam antinaturais, como é o caso do homossexualismo. A História nos mostra que a intolerância diante desses comportamentos é cíclica e variável nas culturas nacionais de cada época. O fato é que esses comportamentos fazem parte da condição humana. Talvez conviesse ao deputado Bolsonaro ampliar o leque de suas preocupações, e não limitá-las a um só assunto. Ele corre o risco de além da imagem de violento, também se tornar um parlamentar aborrecido, com seu samba de uma nota só.

Sua última tentativa de ofensa à presidente Dilma Rousseff – já acostumada a injúrias vis, como a de que é “assassina de criancinhas” - com a ridícula e desprezível insinuação divulgada, provocou a reação de grande parte dos parlamentares, muitos deles já alvos da agressividade verbal de Bolsonaro. Não se iluda o deputado pelo Rio de Janeiro. Se houver uma vontade política da maioria da Câmara dos Deputados, o seu mandato poderá vir a ser cassado por falta de decoro parlamentar. O conceito de decoro é político. O julgamento político não se submete aos ritos jurídicos comuns. É um ato de vontade da maioria, que o exerce conforme a Constituição.

Como disse, em debate crucial na Assembléia Francesa, o grande Robespierre, ao defender a sentença de morte contra Luís 16, o julgamento político nada tem a ver com a legislação penal.

Sendo assim, convém a Bolsonaro controlar a sua linguagem.



Mauro Santayana é colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte.



(Carta Maior)

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Mídia II

Colunistas| 08/08/2011 | Copyleft
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DEBATE ABERTO

Globo: os princípios, a credibilidade e a prática
Não deixa de ser intrigante que os “Princípios Editoriais das Organizações Globo” tenham sido divulgados apenas algumas semanas após o estouro do escândalo envolvendo a News Corporation e um dia depois que um ex-jornalista da própria Globo tenha postado em seu Blog – com grande repercussão na blogosfera – que havia uma orientação na TV Globo para tentar incompatibilizar o novo Ministro da Defesa com as Forças Armadas.
Venício Lima

Deve ter sido coincidência. Todavia, não deixa de ser intrigante que os “Princípios Editoriais das Organizações Globo” tenham sido divulgados apenas algumas semanas após o estouro do escândalo envolvendo a News Corporation e um dia depois que um ex-jornalista da própria Globo tenha postado em seu Blog – com grande repercussão na blogosfera – que havia uma orientação na TV Globo para tentar incompatibilizar o novo Ministro da Defesa com as Forças Armadas.

Credibilidade: questão de sobrevivência
A credibilidade passou a ser um elemento absolutamente crítico no “mercado” da notícia. O monopólio dos velhos formadores de opinião não existe mais. Não é sem razão que as curvas de audiência e leitura da velha mídia estejam em queda e o “negócio”, no seu formato atual, ameaçado de sobrevivência.

Na contemporaneidade, são muitas as fontes de informação disponíveis para o cidadão comum e as TICs ampliaram de forma exponencial as possibilidades de checagem daquilo que está sendo noticiado. Sem credibilidade, a tendência é que os veículos se isolem e “falem”, cada vez mais, apenas para o segmento da população que compartilha previamente de suas posições editoriais e busca confirmação diária para elas, independentemente dos fatos.

O escândalo do “News of the World” explicitou formas criminosas de atuação de um dos maiores conglomerados de mídia do mundo, destruiu sua credibilidade e levantou a suspeita de que não é só o grupo de Murdoch que pratica esse tipo de “jornalismo”. Além disso, a celebrada autorregulamentação existente na Inglaterra – por mais que o fato desagrade aos liberais nativos – comprovou sua total ineficácia. As repercussões de tudo isso começam a aparecer. Inclusive na Terra de Santa Cruz.

Os Princípios da Globo
No Brasil ainda não existe sequer autorregulamentação e as Organizações Globo, o maior grupo de mídia do país, não tem um único Ombudsman em suas dezenas de veículos para acolher sugestões e críticas de seus “consumidores”. Neste contexto, a divulgação de princípios editoriais – sejam eles quais forem – é uma referência do próprio grupo em relação à qual seu jornalismo pode ser avaliado. Não deixa de ser um avanço.

A questão, todavia, é que o histórico da Globo não credencia os Princípios divulgados. Em diferentes ocasiões, ao longo dos últimos anos, coberturas tendenciosas que se tornaram clássicas, foram documentadas. E alguns pontos reafirmados e/ou ausentes dos Princípios agora divulgados reforçam dúvidas. Lembro dois: a presunção de inocência e as liberdades “absolutas”.

Presunção de inocência
O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, adotado pela FENAJ, acolhe uma garantia constitucional (inciso LVII do artigo 5º) que tem origem na Revolução Francesa e reza em seu artigo 9º: “a presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística”.

Não é necessário lembrar que o poder da velha mídia continua avassalador quando atinge a esfera da vida privada, a reputação das pessoas, seu capital simbólico. Alguém acusado e “condenado” pela mídia por um crime que não cometeu dificilmente se recupera. Os efeitos são devastadores. Não há indenização que pague ou corrija os danos causados. Apesar disso, a ausência da presunção de inocência tem sido uma das características da cobertura política das Organizações Globo.

Um exemplo: no auge da disputa eleitoral de 2006, diante da defesa que o PT fez de filiados seus que apareceram como suspeitos no escândalo chamado de “sanguessugas”, o jornal “O Globo” publicou um box de “Opinião” sob o título “Coerência” (12/08/2006, Caderno A pp.3/4) no qual afirmava:

“Não se pode acusar o PT de incoerência: se o partido protege mensaleiros, também acolhe sanguessugas. Sempre com o argumento maroto de que é preciso esperar o julgamento final. Maroto porque o julgamento político e ético não se confunde com o veredicto da Justiça. (...) Na verdade, a esperança do PT, e de outros partidos com postura idêntica, é que mensaleiros e sanguessugas sejam salvos pela lerdeza corporativista do Congresso e por chicanas jurídicas. Simples assim.”

Em outras palavras, para O Globo, a presunção de inocência é uma garantia que só existe no Judiciário. A mídia pode denunciar, julgar e condenar. Não há nada sobre presunção de inocência nos Princípios agora divulgados.

Aparentemente, a postura editorial de 2006 continua a prevalecer nas Organizações Globo.

Liberdades absolutas?
Para as Organizações Globo a liberdade de expressão é um valor absoluto (Seção I, letra h) e “a liberdade de informar nunca pode ser considerada excessiva” (Seção III).

Sem polemizar aqui sobre a diferença entre liberdade de expressão e liberdade de imprensa – que não é mencionada sequer uma única vez nos Princípios – lembro que nem mesmo John Stuart Mill considerava a liberdade de expressão absoluta. Ela, como, aliás, todas as liberdades, têm como limite a liberdade do outro.

Em relação à liberdade de informar, não foi exatamente o fato de “nunca considerá-la excessiva” que levou a News Corporation a violar a intimidade e a privacidade alheia e a cometer os crimes que cometeu?

O futuro dirá
Se haverá ou não alterações na prática jornalística “global”, só o tempo dirá. Ao que parece, as ressonâncias do escândalo envolvendo o grupo midiático do todo poderoso Rupert Murdoch e a incrível capilaridade social da blogosfera, inclusive entre nós, já atingiram o maior grupo de mídia brasileiro.

A ver.



Professor Titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Regulação das Comunicações – História, poder e direitos, Editora Paulus, 2011.




(Carta Capital)

Mídia

reforma política começa pela mídia
By Bruno Cava– 08/07/2011
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Por Bruno Cava, do Outras Palavras e Universidade Nômade

Fala-se muito em reforma política, mas nenhuma reforma política é mais fundamental do que a democratização da mídia. Esta a grande reforma que o país aguarda há décadas. Governos mudam, regimes mudam, séculos mudam, mas o mesmo regime excludente e oligárquico prevalece nas comunicações brasileiras. Aqui, sequer o capitalismo liberal chegou. É um oligopólio de empresas familiares. Partilham entre si as concessões de TV e rádio, de norte a sul, por meio de suas filiais e retransmissoras. E ainda controlam simultaneamente jornais, revistas, editoras, produtoras de filmes e teatro.

Esses grandes grupos se vendem como imparciais e neutros, mas estão entranhados na política nacional e global, com posições conservadoras. Apoiaram a ditadura cívico-militar e agora se opõem à busca pela verdade histórica (que os desmascara). Colocam-se como paladinos da liberdade de expressão, mas são os primeiros a censurar vozes discordantes e despedir funcionários incômodos. Apresentam-se como sacerdotes da ética pública, mas as suas campanhas moralizantes não passam de instrumentos de chantagem e intimidação. Dizem-se praticantes do bom jornalismo, mas isto só significa certa forma vertical e elitizante de produzir e circular verdade e legitimidade. A opinião pública está contra o povo.

Um regime democrático não se concretiza quando toda a mídia for estatal, mas quando todos formos mídia. Quando for concedida voz aos sem-voz. Quando uma multidão de verdades e narrativas ocupar e disputar o espaço público. Mais vital à democracia que a tal “reforma política”, como vem se apresentando, é pôr em movimento um processo de empoderamento midiático de todos os cidadãos. Sem intermediário$ ou usurpadores da opinião pública, afirmar condições materiais para exercício do direito à expressão e construção coletiva e compartilhamento. Nessa luta, o estado não é o guardião da comunicação democrática, mas o seu maior inimigo. Não basta construir uma “TV pública” e muito menos fortalecer a TV dos bispos.

Mas para não cair na abstração, é preciso reconhecer que a voz nunca será concedida aos sem-voz. É preciso conquistar a polifonia, contra o coro da grande imprensa. Não está em jogo uma luta pela verdade, mas pelo regime de produção de verdades. A história da imprensa brasileira é a história de sua concentração e elitização. As forças democráticas foram derrotadas em praticamente todas as tentativas de desconstituir o oligopólio. E já estamos perdendo de novo. Nos últimos dez anos, foi perdida a batalha pela TV digital, por outro marco regulatório das comunicações, pelas rádios comunitárias. E estão sendo perdidas as batalhas por um Brasil banda larga, pelo compartilhamento de conteúdos, pela multiplicação de pontos de cultura e mídia livres.

O que fazer?

O movimento pode pressionar o estado por mais democracia na mídia. Mas isso cai num ciclo vicioso. Porque, para pressionar, tem que ter mídia, senão não faz efeito. É preciso capilaridade social, construção de redes e formulação de discursos pervasivos. Então é preciso, primeiro, tornar-se mídia. Mais do que isso, uma mídia diferente, inovadora e alternativa — além dos vícios do bom jornalismo, da qualidade formal e de edição centralizada, que caracterizam a grande imprensa. Quando os blogueiros progressistas reproduzem o mesmo modus operandi dessa mídia velha, não fazem outra coisa que fortalecê-la, reafirmando a estrutura conservadora. Fica parecendo que, no fundo, ambicionam ser grande imprensa eles mesmos, com o sinal trocado. E não progridem senão no caminho errado.

Constituir novas mídias apesar do estado. Isto é, constituindo um outro mundo que pode atravessar e reconstruir as instâncias tradicionais de representação: governo, partidos e grande imprensa. A tarefa reside em promover e ampliar a cauda longa de blogues e sites de esquerda, pontos e portais de mídia livre, rádios comunitárias, redes militantes e coletivos político-culturais das periferias, político-midiáticos e de artivismo subversivo. A criação de um potente discurso altermundista não se dá somente na língua escrita, mas também com filmes digitais, peças independentes, grafite, dança de rua, festivais fora do eixo comercial etc. Tudo isso numa teia de relações transversais e colaborativas, em sinergia de ações e resistências, cada um na sua diferença, num ativismo de enxame. Essa rede mobilizada, que circula conhecimento e o reformula, que inventa e reinventa modos de organizar e produzir, esse movimento dos movimentos, já está arrancando audiência do Jornal Nacional, — e tem tudo para constituir uma força política além do esquema tradicional de governos e partidos.

Nesse caldeirão, nascem iniciativas de contrapoder, como o Wikileaks, a Wikipídia, o Anonymous, a Universidade Nômade, o Centro de Mídia Independente, o Outras Palavras, o Diário Liberdade, o Trezentos, entre tantos outros. Assim, não admira o vigilantismo da internet, com seus AI5 digitais e leis Sinde, mas também de modo mais sutil, como no controle de Facebook e tuíter. Não admira, tampouco, a reação das operadoras de telefonia contra a universalização da banda larga e o compartilhamento wi-fi, — que dobrou, pela força política (midiática), a minoria de esquerda na composição do governo Dilma. Enquanto isso, os movimentos sociais das rádios comunitárias, dos grupos de compartilhamento livre, dos coletivos hackers vêm sofrendo com a intensificação da criminalização.

Mas não sejamos ingênuos, nem nos furtemos à permanente e saudável autocrítica. As novas mídias por vezes acabam reproduzindo estruturas hierárquicas, onde a horizontalidade não é nada além de uma relação de força posta em questão. Os novos modos de organizar em rede e enxame significam, sobretudo, assumi-los como um campo de batalha, continuamente atravessados pela produção comum e pelas tentativas de capturá-lo comercial ou publicitariamente. É fundamental manter-se lúcido sobre os riscos e limitações da forma-rede. Não perder de vista a horizontalidade, o compartilhamento, a lógica de código aberto e o excedente de cooperação (em relação ao mercado), — que é o próprio trabalho vivo e que, portanto, faz vivificar o movimento social.

O que fazer?

Articular mais redes, empoderar mais gente no processo de produção de verdades e narrativas, promover mais espaços dialógicos e horizontais. Seguir debatendo-se contra o gigantesco polvo das comunicações, nesta democracia mais-que-imperfeita. E continuar lutando e blogando e tuitando, em suma, devir mídia.

(Outras Palavras)

Mídia

reforma política começa pela mídia
By Bruno Cava– 08/07/2011
Posted in: Posts


Por Bruno Cava, do Outras Palavras e Universidade Nômade

Fala-se muito em reforma política, mas nenhuma reforma política é mais fundamental do que a democratização da mídia. Esta a grande reforma que o país aguarda há décadas. Governos mudam, regimes mudam, séculos mudam, mas o mesmo regime excludente e oligárquico prevalece nas comunicações brasileiras. Aqui, sequer o capitalismo liberal chegou. É um oligopólio de empresas familiares. Partilham entre si as concessões de TV e rádio, de norte a sul, por meio de suas filiais e retransmissoras. E ainda controlam simultaneamente jornais, revistas, editoras, produtoras de filmes e teatro.

Esses grandes grupos se vendem como imparciais e neutros, mas estão entranhados na política nacional e global, com posições conservadoras. Apoiaram a ditadura cívico-militar e agora se opõem à busca pela verdade histórica (que os desmascara). Colocam-se como paladinos da liberdade de expressão, mas são os primeiros a censurar vozes discordantes e despedir funcionários incômodos. Apresentam-se como sacerdotes da ética pública, mas as suas campanhas moralizantes não passam de instrumentos de chantagem e intimidação. Dizem-se praticantes do bom jornalismo, mas isto só significa certa forma vertical e elitizante de produzir e circular verdade e legitimidade. A opinião pública está contra o povo.

Um regime democrático não se concretiza quando toda a mídia for estatal, mas quando todos formos mídia. Quando for concedida voz aos sem-voz. Quando uma multidão de verdades e narrativas ocupar e disputar o espaço público. Mais vital à democracia que a tal “reforma política”, como vem se apresentando, é pôr em movimento um processo de empoderamento midiático de todos os cidadãos. Sem intermediário$ ou usurpadores da opinião pública, afirmar condições materiais para exercício do direito à expressão e construção coletiva e compartilhamento. Nessa luta, o estado não é o guardião da comunicação democrática, mas o seu maior inimigo. Não basta construir uma “TV pública” e muito menos fortalecer a TV dos bispos.

Mas para não cair na abstração, é preciso reconhecer que a voz nunca será concedida aos sem-voz. É preciso conquistar a polifonia, contra o coro da grande imprensa. Não está em jogo uma luta pela verdade, mas pelo regime de produção de verdades. A história da imprensa brasileira é a história de sua concentração e elitização. As forças democráticas foram derrotadas em praticamente todas as tentativas de desconstituir o oligopólio. E já estamos perdendo de novo. Nos últimos dez anos, foi perdida a batalha pela TV digital, por outro marco regulatório das comunicações, pelas rádios comunitárias. E estão sendo perdidas as batalhas por um Brasil banda larga, pelo compartilhamento de conteúdos, pela multiplicação de pontos de cultura e mídia livres.

O que fazer?

O movimento pode pressionar o estado por mais democracia na mídia. Mas isso cai num ciclo vicioso. Porque, para pressionar, tem que ter mídia, senão não faz efeito. É preciso capilaridade social, construção de redes e formulação de discursos pervasivos. Então é preciso, primeiro, tornar-se mídia. Mais do que isso, uma mídia diferente, inovadora e alternativa — além dos vícios do bom jornalismo, da qualidade formal e de edição centralizada, que caracterizam a grande imprensa. Quando os blogueiros progressistas reproduzem o mesmo modus operandi dessa mídia velha, não fazem outra coisa que fortalecê-la, reafirmando a estrutura conservadora. Fica parecendo que, no fundo, ambicionam ser grande imprensa eles mesmos, com o sinal trocado. E não progridem senão no caminho errado.

Constituir novas mídias apesar do estado. Isto é, constituindo um outro mundo que pode atravessar e reconstruir as instâncias tradicionais de representação: governo, partidos e grande imprensa. A tarefa reside em promover e ampliar a cauda longa de blogues e sites de esquerda, pontos e portais de mídia livre, rádios comunitárias, redes militantes e coletivos político-culturais das periferias, político-midiáticos e de artivismo subversivo. A criação de um potente discurso altermundista não se dá somente na língua escrita, mas também com filmes digitais, peças independentes, grafite, dança de rua, festivais fora do eixo comercial etc. Tudo isso numa teia de relações transversais e colaborativas, em sinergia de ações e resistências, cada um na sua diferença, num ativismo de enxame. Essa rede mobilizada, que circula conhecimento e o reformula, que inventa e reinventa modos de organizar e produzir, esse movimento dos movimentos, já está arrancando audiência do Jornal Nacional, — e tem tudo para constituir uma força política além do esquema tradicional de governos e partidos.

Nesse caldeirão, nascem iniciativas de contrapoder, como o Wikileaks, a Wikipídia, o Anonymous, a Universidade Nômade, o Centro de Mídia Independente, o Outras Palavras, o Diário Liberdade, o Trezentos, entre tantos outros. Assim, não admira o vigilantismo da internet, com seus AI5 digitais e leis Sinde, mas também de modo mais sutil, como no controle de Facebook e tuíter. Não admira, tampouco, a reação das operadoras de telefonia contra a universalização da banda larga e o compartilhamento wi-fi, — que dobrou, pela força política (midiática), a minoria de esquerda na composição do governo Dilma. Enquanto isso, os movimentos sociais das rádios comunitárias, dos grupos de compartilhamento livre, dos coletivos hackers vêm sofrendo com a intensificação da criminalização.

Mas não sejamos ingênuos, nem nos furtemos à permanente e saudável autocrítica. As novas mídias por vezes acabam reproduzindo estruturas hierárquicas, onde a horizontalidade não é nada além de uma relação de força posta em questão. Os novos modos de organizar em rede e enxame significam, sobretudo, assumi-los como um campo de batalha, continuamente atravessados pela produção comum e pelas tentativas de capturá-lo comercial ou publicitariamente. É fundamental manter-se lúcido sobre os riscos e limitações da forma-rede. Não perder de vista a horizontalidade, o compartilhamento, a lógica de código aberto e o excedente de cooperação (em relação ao mercado), — que é o próprio trabalho vivo e que, portanto, faz vivificar o movimento social.

O que fazer?

Articular mais redes, empoderar mais gente no processo de produção de verdades e narrativas, promover mais espaços dialógicos e horizontais. Seguir debatendo-se contra o gigantesco polvo das comunicações, nesta democracia mais-que-imperfeita. E continuar lutando e blogando e tuitando, em suma, devir mídia.

(Outras Palavras)

Mídia

reforma política começa pela mídia
By Bruno Cava– 08/07/2011
Posted in: Posts


Por Bruno Cava, do Outras Palavras e Universidade Nômade

Fala-se muito em reforma política, mas nenhuma reforma política é mais fundamental do que a democratização da mídia. Esta a grande reforma que o país aguarda há décadas. Governos mudam, regimes mudam, séculos mudam, mas o mesmo regime excludente e oligárquico prevalece nas comunicações brasileiras. Aqui, sequer o capitalismo liberal chegou. É um oligopólio de empresas familiares. Partilham entre si as concessões de TV e rádio, de norte a sul, por meio de suas filiais e retransmissoras. E ainda controlam simultaneamente jornais, revistas, editoras, produtoras de filmes e teatro.

Esses grandes grupos se vendem como imparciais e neutros, mas estão entranhados na política nacional e global, com posições conservadoras. Apoiaram a ditadura cívico-militar e agora se opõem à busca pela verdade histórica (que os desmascara). Colocam-se como paladinos da liberdade de expressão, mas são os primeiros a censurar vozes discordantes e despedir funcionários incômodos. Apresentam-se como sacerdotes da ética pública, mas as suas campanhas moralizantes não passam de instrumentos de chantagem e intimidação. Dizem-se praticantes do bom jornalismo, mas isto só significa certa forma vertical e elitizante de produzir e circular verdade e legitimidade. A opinião pública está contra o povo.

Um regime democrático não se concretiza quando toda a mídia for estatal, mas quando todos formos mídia. Quando for concedida voz aos sem-voz. Quando uma multidão de verdades e narrativas ocupar e disputar o espaço público. Mais vital à democracia que a tal “reforma política”, como vem se apresentando, é pôr em movimento um processo de empoderamento midiático de todos os cidadãos. Sem intermediário$ ou usurpadores da opinião pública, afirmar condições materiais para exercício do direito à expressão e construção coletiva e compartilhamento. Nessa luta, o estado não é o guardião da comunicação democrática, mas o seu maior inimigo. Não basta construir uma “TV pública” e muito menos fortalecer a TV dos bispos.

Mas para não cair na abstração, é preciso reconhecer que a voz nunca será concedida aos sem-voz. É preciso conquistar a polifonia, contra o coro da grande imprensa. Não está em jogo uma luta pela verdade, mas pelo regime de produção de verdades. A história da imprensa brasileira é a história de sua concentração e elitização. As forças democráticas foram derrotadas em praticamente todas as tentativas de desconstituir o oligopólio. E já estamos perdendo de novo. Nos últimos dez anos, foi perdida a batalha pela TV digital, por outro marco regulatório das comunicações, pelas rádios comunitárias. E estão sendo perdidas as batalhas por um Brasil banda larga, pelo compartilhamento de conteúdos, pela multiplicação de pontos de cultura e mídia livres.

O que fazer?

O movimento pode pressionar o estado por mais democracia na mídia. Mas isso cai num ciclo vicioso. Porque, para pressionar, tem que ter mídia, senão não faz efeito. É preciso capilaridade social, construção de redes e formulação de discursos pervasivos. Então é preciso, primeiro, tornar-se mídia. Mais do que isso, uma mídia diferente, inovadora e alternativa — além dos vícios do bom jornalismo, da qualidade formal e de edição centralizada, que caracterizam a grande imprensa. Quando os blogueiros progressistas reproduzem o mesmo modus operandi dessa mídia velha, não fazem outra coisa que fortalecê-la, reafirmando a estrutura conservadora. Fica parecendo que, no fundo, ambicionam ser grande imprensa eles mesmos, com o sinal trocado. E não progridem senão no caminho errado.

Constituir novas mídias apesar do estado. Isto é, constituindo um outro mundo que pode atravessar e reconstruir as instâncias tradicionais de representação: governo, partidos e grande imprensa. A tarefa reside em promover e ampliar a cauda longa de blogues e sites de esquerda, pontos e portais de mídia livre, rádios comunitárias, redes militantes e coletivos político-culturais das periferias, político-midiáticos e de artivismo subversivo. A criação de um potente discurso altermundista não se dá somente na língua escrita, mas também com filmes digitais, peças independentes, grafite, dança de rua, festivais fora do eixo comercial etc. Tudo isso numa teia de relações transversais e colaborativas, em sinergia de ações e resistências, cada um na sua diferença, num ativismo de enxame. Essa rede mobilizada, que circula conhecimento e o reformula, que inventa e reinventa modos de organizar e produzir, esse movimento dos movimentos, já está arrancando audiência do Jornal Nacional, — e tem tudo para constituir uma força política além do esquema tradicional de governos e partidos.

Nesse caldeirão, nascem iniciativas de contrapoder, como o Wikileaks, a Wikipídia, o Anonymous, a Universidade Nômade, o Centro de Mídia Independente, o Outras Palavras, o Diário Liberdade, o Trezentos, entre tantos outros. Assim, não admira o vigilantismo da internet, com seus AI5 digitais e leis Sinde, mas também de modo mais sutil, como no controle de Facebook e tuíter. Não admira, tampouco, a reação das operadoras de telefonia contra a universalização da banda larga e o compartilhamento wi-fi, — que dobrou, pela força política (midiática), a minoria de esquerda na composição do governo Dilma. Enquanto isso, os movimentos sociais das rádios comunitárias, dos grupos de compartilhamento livre, dos coletivos hackers vêm sofrendo com a intensificação da criminalização.

Mas não sejamos ingênuos, nem nos furtemos à permanente e saudável autocrítica. As novas mídias por vezes acabam reproduzindo estruturas hierárquicas, onde a horizontalidade não é nada além de uma relação de força posta em questão. Os novos modos de organizar em rede e enxame significam, sobretudo, assumi-los como um campo de batalha, continuamente atravessados pela produção comum e pelas tentativas de capturá-lo comercial ou publicitariamente. É fundamental manter-se lúcido sobre os riscos e limitações da forma-rede. Não perder de vista a horizontalidade, o compartilhamento, a lógica de código aberto e o excedente de cooperação (em relação ao mercado), — que é o próprio trabalho vivo e que, portanto, faz vivificar o movimento social.

O que fazer?

Articular mais redes, empoderar mais gente no processo de produção de verdades e narrativas, promover mais espaços dialógicos e horizontais. Seguir debatendo-se contra o gigantesco polvo das comunicações, nesta democracia mais-que-imperfeita. E continuar lutando e blogando e tuitando, em suma, devir mídia.

(Outras Palavras)

Esquerda

22.11.11 - Espanha
'Hoy ser de izquierdas significa luchar día a día por nuestros derechos y no claudicar frente a los intereses privados y del capital'
Rebelión
http://www.rebelion.org/
Adital
*Por Santiago Alba Rico - Rebelión





Esther Vivas es una conocida activista, autora además de numerosos libros sobre movimientos sociales y consumo responsable. El pasado día 12 fue llamada a declarar por la policía como imputada de violación de domicilio público tras la ocupación simbólica, unos días antes, de la sede de CatalunyaCaixa en Barcelona. Por su parte, Miguel Urbán es también activista y miembro de la redacción de Viento Sur. Esther y Miguel son respectivamente los candidatos por Barcelona y Madrid de Anticapitalistas en las elecciones del próximo domingo.

¿Por qué habéis decidido presentaros a las elecciones? ¿Para qué puede servir obtener un puñado de votos en unos comicios de los que saldrá un Parlamento que, según la consigna del 15-M, "no nos representa"?
Esther Vivas.- Nosotros pensamos que el sistema sólo puede cambiarse desde la lucha en la calle y la movilización social. Cambiar el sistema desde dentro no es posible, como ha quedado patente con los Gobiernos de "izquierdas” a escala estatal, catalana o en otros territorios, donde éstos han acabado claudicando frente a los intereses de la patronal y los mercados. Pero no podemos resignarnos a dejar el terreno de la política en las instituciones a los profesionales de la política, que gestionan los asuntos colectivos como si se tratara de su coto privado. Tener cargos electos anticapitalistas sería útil como altavoz de las luchas sociales y como plataforma desde la que difundir propuestas de transformación social. Pienso que es importante plantear una alternativa política en el terreno electoral y romper con la abstención resignada o el voto útil, que sólo resulta útil a quien lo recibe, es decir, a los aparatos políticos de siempre. Para nosotros las elecciones son una cuestión táctica, un instrumento para llegar a más gente, para debatir de política y para ir aglutinando voluntades entorno a una perspectiva de ruptura con el actual modelo de sociedad. De hecho, si las elecciones sirviesen para alguna cosa, como se ha repetido varias veces, las hubiesen prohibido hace tiempo.

El 15-M, con su enorme poder deslegitimador y su bajísimo poder de intervención, demuestra que en el Estado español y en toda Europa la democracia y la política discurren paralelas al poder real (el de, por ejemplo, decidir sobre el deficit o aceptar un "rescate bancario"), ¿En qué sentido vuestra candidatura recoge y prolonga el espíritu del 15-M? ¿Cuál es vuestra opinión sobre este movimiento? Algunos os han acusado de haber tratado de explotarlo en vuestro favor, ¿es eso cierto?
Miguel Urbán.- Nuestra candidatura está formada por activistas del 15-M, con "dobles” y "triples” militancias en otros movimientos sociales. Precisamente porque conocemos el movimiento desde dentro y somos leales con él, ni queremos representarlo ni queremos que haya la menor ambigüedad sobre esto. Los movimientos sociales deciden por sí mismos quienes, cuando y para qué les representan. De hecho, a día de hoy, lo mejor del 15-m está siendo la extensión de un "estilo de hacer" 15-M que ya se está expresando en otros conflictos sociales: el de los desahucios, el de la sanidad, la educación. La gente quiere ser protagonista, decidir, organizarse en asambleas. Ese es un valor fundamental para la articulación de nuevas formas de auto-organización tan necesarias.

Respecto a si recogemos el "espíritu" del 15-M, creemos que ese espíritu está construyendo un "sentido común" sociopolítico frente a la dictadura de los mercados: la acción directa, la desobediencia y, en definitiva, el cuestionamiento de esta "democracia” que secuestra la voluntad popular. Esto nos concierne a toda la gente anticapitalista. En este sentido lo compartimos y participamos en la prolongación que hará el propio movimiento, aportando en él lo que pensamos y hacemos.

Quien nos acuse de querer explotar al movimiento en nuestro beneficio está incumpliendo una de las normas básicas del movimiento que es el respeto. Si alguna vez aportan alguna prueba responderemos. De las acusaciones gratuitas, pasamos.

Creo que habéis mantenido conversaciones con otros grupos y partidos para presentar una candidatura más amplia. ¿Cuáles son esos grupos y por qué han fracasado esas conversaciones? ¿Cuáles crees que son los obstáculos para una unidad de la izquierda?
Miguel.- En Izquierda Anticapitalista somos conscientes de la necesidad de desarrollar una politica unitaria hacia la izquierda alternativa, social y política. En este sentido. lanzamos antes de verano una propuesta en forma de "Carta abierta a la izquierda alternativa" (http://www.anticapitalistas.org/Carta-abierta-a-la-izquierda) que buscaba sondear la posibilidad de un acuerdo amplio basado en un cambio radical en la forma de hacer y entender la política, participativa, leal a los movimientos sociales y a las luchas, por tanto no profesional, así como medidas necesarias para una ruptura democrática que desobedezca a los mercados y les plante cara.

Nos reunimos con IU. Comprobamos que no existía un acuerdo sobre los planteamientos que realizábamos en nuestra propuesta y que su interés se limitaba a un acuerdo de puestos en las listas. Esta es una vieja e inútil forma de hacer política, por supuesto la rechazamos.

Sin embargo, esta candidatura sí ha permitido continuar profundizando en experiencias de colaboración entre distintos grupos. A la candidatura se han incorporado colectivos políticos como En Lucha, Lucha Internacionalista, Los Verdes de la Comunidad de Madrid, Izquierda Social y Ecologista. Esto implica una modesta acumulación de fuerzas que sigue siendo lenta y aún débil frente a los retos por delante. De todas formas, la política unitaria no debe darse fundamentalmente en clave electoral sino en ver cómo podemos organizar resistencias conjuntas y comunes frente a los diferentes ataques que estamos recibiendo desde los poderes económico y político. Ya lo vimos durante la reforma laboral o de las pensiones. Hay que valorar cómo y entre quiénes somos capaces de construir marcos de organización y de lucha comunes que sirvan de base a acuerdos más amplios. Es ahí donde tenemos un reto importante para el próximo periodo. Las elecciones pasan, al fin y al cabo, pero la dictadura de los mercados y sus ataques permanecerán.

¿Habéis tenido contactos con la izquierda abertzale? ¿Creéis que la declaración de ETA y la previsible explosión electoral de Amaiur puede facilitar una convergencia, hasta ahora siempre llena de malentendidos y tensiones, entre la izquierda vasca y la del resto del Estado? ¿En qué medida piensas que la normalización política del País Vasco, si finalmente se produce, puede alterar las relaciones de fuerza o desplazar, por ejemplo, los focos de criminalización por parte de un Estado cada vez más intolerante frente a toda forma de disidencia?
Miguel.- El final de la lucha armada podría abrir una nueva etapa en las relaciones entre la izquierda abertzale y la izquierda anticapitalista. También podría ayudar en el mismo sentido un grupo parlamentario que deseamos que obtenga Amaiur. Por nuestra parte hay la mejor disposición, especialmente considerando que el nuevo gobierno del PP reactivará un nacionalismo español ultramontano como herramienta para cohesionar a su base frente a los recortes y la crisis económica.

El fin de de la actividad militar de ETA desactiva una parte de la legitimación desde el poder para vulnerar derechos, justificar la represión y criminalizar la disidencia. Pero aparecerán nuevas fórmulas contra la disidencia, el antisistema sustituirá rápidamente al pro-etarra, de hecho en los últimos tiempos ya hemos visto como se empezaba a gestar el cambio. Con el desarrollo de la crisis y la agudización de los antagonismos y de la lucha de clases, el poder construirá otro relato criminalizador de la disidencia.

En medio de esta crisis global -económica, política, ecológica, antropológica-, cuando cada vez es más evidente que tampoco los centros capitalistas desarrollados pueden permitirse ya Estado de Bienestar, Democracia y Estado de Derecho, ¿qué crees tú que significa hoy ser de izquierdas?
Esther.-Mantener el firme propósito de cambiar el mundo de base en un sentido solidario y de justicia social. Está claro que capitalismo y democracia son dos conceptos antagónicos. A más capitalismo menos democracia y viceversa. Hoy ser de izquierdas significa luchar día a día por nuestros derechos y no claudicar frente a los intereses privados y del capital. No venderse frente a los cantos de sirena de un capitalismo más "humano” y "verde”. Construir alternativas en lo cotidiano, no resignarse, y luchar por aquello que es nuestro.

En algún texto he escrito que, en el nuevo contexto tecnológico y laboral, la "juventud" es ya una clase social transversal a las edades y los países y que esa clase social está dominada, incluso cuando lucha contra él, por el imaginario deseante del mercado. ¿Crees que es eso cierto? ¿Y en qué medida te parece que la lucha, así planteada, ciberdependiente y antinarrativa, es compatible con la construcción de "otro mundo posible", también en términos ecológicos?
Miguel.- El gran triunfo del capitalismo ha sido conquistar las mentes. La lógica del beneficio, de la acumulación se ha incrustado en las mentes de una buena parte de la población trabajadora. Al final, el sueño del ascensor social ha funcionado como un señuelo, contribuyendo al mito de una especie de "capitalismo popular”. Pero vivimos tiempos en que ni siquiera la maquinaria mediática y consumista del capital está pudiendo frenar la ola de miedo sobre el futuro que atenaza hoy a tanta gente. Romper con esas lógicas y apostar por una ética de la auto-limitación es más que necesario para una transición en clave ecologista y socialista. Volver a pensar en términos de generaciones, en lógicas colectivas y de bienes comunes. El neoliberalismo ha pretendido situarnos ante el precipicio de individualizar problemas colectivos (el de la vivienda, el de la educación, el del empleo). Salir de esa lógica infernal que nos aisla y nos individualiza es fundamental en este momento. Ese grito de "juntos podemos" es, en sí mismo, disputar el terreno al control social propio del liberalismo.

En cuanto al papel de la juventud, completamente de acuerdo. El capitalismo es la infantilización social. Lo estamos viendo en este momento en Grecia o en Italia de forma terrible. El mensaje es claro: no podéis decidir, no sabéis lo que queréis. Eso abre la puerta al "gobierno de los tecnócratas" (o como dice CiU en Catalunya "al gobierno de los mejores"). Eso es el padre de familia decidiendo sobre los asuntos comunes. Un padre cada vez más autoritario, aunque presentado como "tolerante, compasivo". Eso lo señala muy bien Zizek. Como es posmodernismo blando es en sí mismo casi más peligroso que otras formas de gobierno.

Pero hay esperanza. El resurgir de los movimientos estudiantiles en medio mundo o el papel de la juventud muestran que no todo está perdido. En realidad, detrás de las revueltas de los indignados hay una forma de canalizar una rebelión instintiva contra esa infantilización. La exigencia de poder auto-gobernarnos, de una democracia real frente a la dictadura de los mercados etc. son señales al respecto. Y también en el uso que los movimientos hacen de las nuevas tecnologías. Ahí podemos encontrar manifestaciones magníficas de reapropiación colectiva y pública de herramientas tecnológicas que confrontan con los usos privativos y lucrativos que el capital quiere imponer. Esas luchas contra la propiedad tienen nuevas formas pero no son muy distintas a las formas de sabotaje o de apropiación de los medios de producción que la clase obrera ensayó (y lo sigue haciendo) durante las últimas décadas.

¿Cuál sería una política económica de izquierdas para Europa?
Esther.-Hoy Europa se sustenta en unos criterios económicos y monetarios que obedecen a los intereses de los grandes grupos empresariales. Es necesario avanzar hacia una Europa solidaria y de los pueblos que rompa con la actual Unión Europea desde una perspectiva internacionalista. Otras políticas económicas son posibles: romper el pacto del Euro; expropiar el sistema bancario; una reforma fiscal progresiva, quien más tiene más pague; perseguir el fraude fiscal; acabar con los paraísos fiscales; tasar el movimiento de capitales internacionales; poner fin a las SICAV; reducir la jornada laboral sin reducir el salario, etc.

Dame cinco razones que puedan convencer a mi suegra para ser anticapitalista.
Esther.- Hoy este sistema no funciona. Millones de personas pasan hambre en un mundo de la abundancia de comida, cuantas personas se quedan sin casa en un país donde hay millones de pisos vacíos, cada vez más personas son pobres mientras que los ricos son más ricos, el paro afecta a un 40% de las y los jóvenes pero nos quieren hacer trabajar hasta los 67 años. Yo le diría a tu suegra que este mundo es un sinsentido y que si quiere un mundo mejor para sus nietos, si quiere mantener su pensión, que no le cierren el ambulatorio ni su centro de día... que se una al movimiento de protesta más grande hoy en el Estado español: el 15M. Juntas, como dicen desde la calle, podemos. Ser anticapitalista hoy es lo más normal del mundo visto como va todo. Lo extraño es seguir creyendo en este sistema. Lo que sería realmente complicado es buscar cinco razones para ser procapitalista!

Sin duda la revolución va muy por detrás, en medios y en conciencia, de la agresivísima contrarrevolución (o contrarrevoluciones, como señala Carlos Alberto Ruiz) que tratan, al mismo tiempo, de lubricar el capitalismo y desactivar las resistencias, pero lo cierto es que el año que ahora acaba nos ha deparado la sorpresa de un malestar activo -en el mundo árabe y en Europa- que ni la represión ni el soborno han podido acallar completamente. ¿En qué sentido te parece -si es que te lo parece- que estas expresiones de "indignación" obligan a revisar esquemas de interpretación clasicos sobre modelos de organización, liderazgo y participación?
Esther.- Las movilizaciones de este 2011 en ambas orillas del Mediterráneo han sido de gran importancia y marcan un punto de inflexión. Después de un par de años en los que dominó el letargo y el miedo ha quedado claro ahora que los pueblos no aceptan de forma resignada las políticas de ajuste. Lo que empezó el 15M no es algo pasajero sino el inicio de un nuevo ciclo. Y como cada vez que esto ocurre la protesta social llega de forma disruptiva e innovadora y desafiando esquemas establecidos. Aquellas que queremos cambiar el mundo tenemos que aprender del "movimiento real” y, al mismo tiempo, aportar nuestras ideas y bagaje y contrastar el presente con la experiencia, buena y mala, acumulada del pasado. El movimiento expresa una fuerte voluntad de recuperar la actividad colectiva desde abajo, de reapropiarnos del propio futuro colectivo y cuestiona la política tradicional. Éste es el punto de partida para cualquier reflexión estratégica sobre formas de organización y participación.

Por último, ¿qué perspectivas de voto tenéis en Catalunya y en el resto del Estado y cuál debe ser la estrategia de organización y lucha a partir del 21 de noviembre, fecha en la que muy probablemente el PP comenzará a gobernar con una mayoría absoluta, radicalizando el ataque contra los harapos de Estado del Bienestar (y las libertades políticas) que aún quedan vivos? Si la confrontación es inevitable, ¿qué tendremos que hacer cuando llegue?
Esther.- No tenemos perspectivas numéricas. Esperamos que el día después del 20N estemos en mejores condiciones para continuar esta lucha que el día anterior. Y como bien señalas lo importante es cómo continuar el "combate” el día después. A lo mejor el PP ganará con una mayoría amplia, pero la mayor parte de la sociedad no votará al PP ni mucho menos las políticas regresivas que éste va a llevar a cabo. Creo que tenemos que tomar conciencia de lo que señalaba metafóricamente Occupy Wall Street: ellos son el 1% y nosotros el 99%. La principal victoria del sistema capitalista es hacernos creer que no hay alternativas posibles y hacernos pensar que los intereses de una minoría privilegiada son los de la mayoría. Y esto es mentira. Afortunadamente la Primavera árabe nos ha devuelta la confianza en que la lucha y la organización colectiva sirven y permiten cambiar las cosas. El próximo periodo, bajo gobierno del PP, estará marcado por una agudización de las tensiones y contradicciones sociales. Los ataques a los derechos sociales se intensificarán pero, sin duda, las resistencias sociales irán a más.

Describe brevemente (para mi suegra) ese otro mundo posible que defendéis.
Miguel.- Depende de tu suegra, verdaderamente no tengo el placer de conocerla, pero partiendo de que es una figura retórica, una persona no politizada, de la "calle”. Realmente, le diría que todo lo contrario a lo que se esta haciendo ahora en el mundo, ya sabes que toda negación lleva una proposición aparejada, que le queremos dar la vuelta, cambiarlo de base. Crear un mundo en el que las mujeres y los hombres puedan convivir libremente y en paz con la naturaleza, donde se construya por fin una cultura humana, liberada del dinero, cooperativa en el trabajo social y en el disfrute de la belleza, la alegría… Algo así, en resumen recuperar nuestra dignidad, reconquistar nuestra vida.


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(Angenpress)

Cuba

22.11.11 - Cuba
Heróis condenados
Frei Betto
Escritor e assessor de movimentos sociais
Adital
"Os últimos soldados da guerra fria”, livro de Fernando Morais editado pela Companhia das Letras (2011), teria suscitado inveja em Ian Fleming, autor de 007, se este não tivesse morrido em 1964, sobretudo por comprovar que, mais uma vez, a realidade supera a ficção.

Suponhamos que na esquina de sua rua haja um bar que abriga suspeitos de assaltarem casas do bairro. Como medida preventiva, você trata de infiltrar um detetive entre eles, de modo a proteger sua família. A polícia, de olho nos meliantes, identifica o detetive. E ao invés de prender os bandidos, encarcera o infiltrado...

Foi o que ocorreu com os cinco cubanos que, monitorados pelos serviços de inteligência de Cuba, se infiltraram nos grupos anticastristas da Flórida, responsáveis por 681 atentados terroristas contra Cuba, que resultaram no assassinato de 3.478 pessoas e causaram danos irreparáveis a outras 2.099.

Desde setembro de 1998, encontram-se presos nos EUA os cubanos Antonio Guerrero, Fernando González, Gerardo Hernández e Ramón Labañino. O quinto, René González, condenado a 15 anos, obteve liberdade condicional no último dia 7 de outubro, mas por ter dupla nacionalidade (americana e cubana) está proibido de deixar o país.

Os demais cumprem pesadas penas: Hernández recebeu condenação de dupla prisão perpétua e mais 15 anos de reclusão... Precisaria de três vidas para cumprir tão absurda sentença. Labañino está condenado à prisão perpétua, mais 18 anos; Guerrero, à prisão perpétua, mais 10 anos; e Fernando a 19 anos.

Os cinco constituíam a Rede Vespa, que municiava Havana de informações a respeito de terroristas que, por avião ou disfarçados de turistas, praticaram atentados contra Cuba, contrabandearam armas e detonaram explosivos em hotéis de Havana, causando ferimentos e mortes.

Bush e Obama deveriam agradecer ao governo cubano por identificar os terroristas que, impunes, usam o território americano para atacar a ilha socialista do Caribe. Acontece, no entanto, exatamente o contrário, revela o livro bem documentado de Fernando Morais. O FBI prendeu os agentes cubanos, e continua a fazer vista grossa aos terroristas que promovem incursões aéreas clandestinas sobre Cuba e treinamentos armados nos arredores de Miami.

Em 15 capítulos, o livro de Morais relata como a segurança cubana prepara seus agentes; a saga do mercenário salvadorenho que, a soldo de Miami, colocou cinco bombas em hotéis e restaurantes de Havana; o papel de Gabriel García Márquez, como pombo-correio, na troca de correspondência entre Fidel e Bill Clinton; a visita sigilosa de agentes do FBI a Havana, e o volume de provas contra a Miami cubana que lhe foram oferecidas por ordem de Fidel.

"Os últimos soldados da guerra fria” é fruto de exaustivas pesquisas e entrevistas realizadas pelo autor em Cuba, EUA e Brasil. Redigido em estilo ágil, desprovido de adjetivações e considerações ideológicas, o livro comprova por que Cuba resiste há mais de 50 anos como único país socialista do Ocidente: a Revolução e suas conquistas sociais incutem na população um senso de soberania que a induz a preservá-las como gesto de amor.

Em país capitalista, para quem, graças à loteria biológica, nasceu em família e classe social imunes à miséria e à pobreza, é difícil entender por que os cubanos não se rebelam contra as autoridades que os governam. Ora, quando se vive num país bloqueado há meio século pela maior potência militar, econômica e ideológica da história, da qual dista apenas 140 km, é motivo de orgulho resistir por tanto tempo e ainda merecer elogios do papa João Paulo II ao visitá-lo em 1998.

Em mais de 100 países – inclusive no Brasil – há médicos e professores cubanos em serviços solidários em áreas carentes. O número de desertores é ínfimo, considerada a quantidade de profissionais que, findo o prazo de trabalho, retornam a Cuba. E a Revolução, como ocorre agora sob o governo de Raúl Castro, tem procurado se atualizar para não perecer.

Talvez este outdoor encontrado nas proximidades do aeroporto de Havana, e citado com frequência por Fernando Morais, ajude a entender a consciência cívica de um povo que lutou para deixar de ser colônia, primeiro, da Espanha e, em seguida, dos EUA: "Esta noite 200 milhões de crianças dormirão nas ruas do mundo. Nenhuma delas é cubana.”

[Frei Betto é escritor, autor de "Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira” (Rocco), entre outros livros. http://www.freibetto.org- twitter:@freibetto.
Copyright 2011 – FREI BETTO – Não é permitida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização do autor. Assine todos os artigos do escritor e os receberá diretamente em seu e-mail. Contato – MHPAL – Agência Literária (mhpal@terra.com.br)]

(Adital)